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Testemunha ocular: o jovem Chance

Article Publicado 2011-09-20 Modificado pela última vez 2023-03-21
Photo: © Mark Craemer
Bisie é a maior mina da região. Está localizada a cerca de 90 quilómetros no interior de uma densa floresta e tem 100 metros de profundidade. Muitas vezes, as minas são pouco mais do que um buraco no chão. Há dezenas de homens e rapazes apinhados em cada mina e as condições são atrozes.

«Chamo-me Chance e tenho 16 anos. Trabalhei na mina de Bisie durante três anos. Soube que tinha sido descoberta uma mina próximo do lugar onde vivo. Queria trabalhar e ganhar o suficiente para construir a minha própria casa. Descer e depois subir, sempre a rastejar, leva tanto tempo que, às vezes, ficava no fundo da mina uma semana sem subir. Todos os meses morrem aqui pessoas, quando um destes poços se desmorona».

Chance, 16

Há cinco anos, nesse local só existia selva. Hoje, trabalham nele nada menos de 20 000 pessoas, no transporte e na extracção de minérios. Vêm de muito longe, com o sonho de ganhar dinheiro, mas o custo de vida é tão elevado, devido aos impostos informais exigidos pelos grupos armados, que a maioria das pessoas não se pode dar ao luxo de voltar a partir. Há centenas de minas destas por todo o leste do Congo. Estima-se que só Bisie produza minérios no valor de 70 milhões de dólares dos EUA por ano.

Uma vez retirados do subsolo, os minérios são trazidos para cidades como Ndjingala, Osakari e Mubi. Os carregadores percorrem a pé 90 quilómetros em dois dias, chegando a carregar 50 kg cada um. Diariamente, saem 600 carregadores da floresta, com 30 toneladas de minérios no total.

A cassiterite de Bisie é comprada por intermediários ligados a exportadores e comerciantes internacionais que revendem o minério a fundições no mercado livre. Nessas empresas, o estanho é refinado e vendido aos fabricantes de solda, quer directamente quer através das bolsas de valores de metais internacionais. Por último, a solda de estanho é vendida aos fabricantes que a utilizam na produção de aparelhos electrónicos.

«A primeira vez que rastejei pelo poço abaixo, não consegui ficar muito tempo. Não estava habituado ao calor, por isso só consegui ficar duas horas lá em baixo. Uma e outra vez, tive de descer, trabalhar muito e depois voltar a subir. Havia muito calor e eu não conseguia suportá-lo. Fugi da mina de Bisie durante um massacre. Mas não consegui realizar o meu sonho, por isso, regressei agora a casa para acabar a escola».

O World Wide Fund for Nature (WWF) (Fundo Mundial de Protecção da Natureza) afirma que a República Democrática do Congo (RDC) é um dos mais importantes centros de biodiversidade do mundo. No entender do WWF, o desafio é preservar as florestas do Congo, as suas espécies e o carbono sequestrado nas florestas tropicais pantanosas, e melhorar, simultaneamente, as condições de vida do povo congolês.

Trata-se de um desafio global. No seu Relatório sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio de 2005, a ONU declara que «apesar dos muitos benefícios da globalização, quase metade dos 2,8 mil milhões de trabalhadores do mundo ainda vivem com menos de 2 dólares por dia. Mais de 500 milhões destes trabalhadores subsistem com metade dessa quantia». Acrescenta ainda que «para reduzir a pobreza é necessário mais emprego e um emprego mais produtivo».

O texto da presente secção de Sinais é parcialmente baseado no documentário «Blood in the Mobile» (Sangue no telemóvel), realizado por Frank Piasecki Poulsen. Os direitos de autor da fotografia do Congo pertencem a Mark Craemer.

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